Pequeno Manual Antirracista, de Djamila Ribeiro

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"Pessoas brancas devem se responsabilizar criticamente pelo sistema de opressão que as privilegia historicamente, produzindo desigualdades, e pessoas negras podem se conscientizar dos processos históricos para não reproduzi-los. Este livro é uma pequena contribuição para estimular o autoconhecimento e a construção de práticas antirracistas."

O racismo configura uma das maiores problemáticas da humanidade e a dificuldade de muitos em perceber a sua natureza estrutural cria obstáculos para uma discussão efetiva sobre o assunto. Contudo, faz-se necessário insistir nesse debate e reunir todos os esforços para tratar a discriminação racial como um dos alvos principais de nossas lutas. Afinal, combater o racismo não é um propósito restrito à população negra, mas um dever de todas as pessoas. Com o intuito de tornar a temática acessível e propor um apanhado geral com números, episódios cotidianos e reflexões acerca do racismo no Brasil, a autora Djamila Ribeiro, mestre em filosofia política e reconhecida internacionalmente por sua influência, escreveu esse manual que, apesar de curto, é bastante completo e cheio de informações indispensáveis para a transformação de quem realiza a leitura. 

A todo momento, é reforçada a relevância de compreender o racismo enquanto um problema estrutural, isto é, inserido nas estruturas de nossa sociedade por intermédio de construções históricas, especialmente a partir da escravização da população negra, cujas implicações no sistema socioeconômico se perpetuam ao longo dos séculos. Nesse sentido, um dado bem significativo apontado pela autora, extraído de uma pesquisa do Datafolha de 1995, indica que 89% dos brasileiros reconhecia a existência de racismo no Brasil, porém 90% se identificava como não racista. Assim, salienta-se: 

"[...] nunca entre numa discussão sobre racismo dizendo 'mas eu não sou racista'. O que está em questão não é um posicionamento moral, individual, mas um problema estrutural [...]" 

Portanto, a mudança desse cenário depende da percepção da dimensão do preconceito de cor e dos benefícios possibilitados aos brancos em virtude dessa estrutura social discriminatória. Para demonstrar esse entendimento, são abordadas evidências de que o "mundo dos brancos" é apresentado como universal, em detrimento dos demais: a definição de referências estéticas com base em padrões europeus, a redução de pessoas negras a determinados estereótipos (copeiras, faxineiras, sambistas), a percepção da ocupação de posições de poder e mesmo vagas em instituições de ensino superior como um direito intrínseco a pessoas brancas. 

Além do reconhecimento do caráter estrutural do racismo, a superação do mito da democracia racial e a ruptura com a tática do "negro único" são destacadas como posturas essenciais à prática antirracista. No tocante à democracia racial, Djamila explica que "[...] esse mito afirma que no Brasil houve a transcendência dos conflitos raciais pela harmonia entre negros e brancos, traduzida na miscigenação e na ausência de leis segregadoras [...]", de modo a amenizar as implicações de um racismo institucionalizado no país e também romantizar toda a violência sofrida pelos negros; nesse aspecto, é válido sublinhar a abordagem do feminismo decolonial acerca da miscigenação forçada por intermédio da violência sexual contra mulheres negras e indígenas. No que tange ao "negro único", trata-se do falso juízo de que a presença de uma única pessoa negra em um espaço é bastante para assegurar a representatividade e a ausência do racismo nesse ambiente.

Outro ponto muito interessante tratado na obra é o denominado epistemicídio, que consiste na negação sistemática da contribuição de grupos oprimidos para a construção do saber, o que se reflete na insuficiência ou mesmo ausência de autores e autoras negras em nossas estantes particulares, bibliotecas e bibliografias de cursos. 

"A importância de estudar autores negros não se baseia numa visão essencialista, ou seja, na crença de que devem ser lidos apenas por serem negros. A questão é que é irrealista que numa sociedade como a nossa, de maioria negra, somente um grupo domine a formulação do saber [...]"

Em suma, Pequeno Manual Antirracista é uma ótima porta de entrada para todos que buscam entender o racismo no Brasil e como contribuir para a luta contra essa problemática estrutural. Ao longo do desenvolvimento são citadas diversas obras com ênfase nos tópicos específicos trabalhados pela Djamila Ribeiro e, ao final, é possível verificar não somente essas referências, mas um pouco da biografia de cada autor negro mencionado. Para encerrar a recomendação, segue o "passo-a-passo" para uma luta antirracista, obtido a partir dos títulos dos capítulos desse livro.

1. Informe-se sobre o racismo
2. Enxergue a negritude
3. Reconheça os privilégios da branquitude
4. Perceba o racismo internalizado em você
5. Apoie políticas educacionais afirmativas
6. Transforme seu ambiente de trabalho
7. Leia autores negros
8. Questione a cultura que você consome
9. Conheça seus desejos e afetos
10. Combata a violência racial 
11. Sejamos todos antirracistas

Minha Estante #120

Título: Pequeno manual antirracista

Autor (a): Djamila Ribeiro
Páginas: 136

Editora: Companhia das Letras

Nota: 5/5

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