Hibisco Roxo, de Chimamanda Ngozi Adichie

13:56:00


"Com frequência fazíamos perguntas cujas respostas já sabíamos. Talvez fizéssemos isso para não precisarmos formular as outras perguntas, aquelas cujas respostas não queríamos saber." (Pág. 29)

Kambili é uma garota de 15 anos, filha de um importante empresário nigeriano. Seu pai, Eugene, é dono de uma indústria e sócio de um jornal que confronta o regime político e os governantes de Enugu, local onde vivem. Parte da riqueza da sua família é direcionada para a Igreja, além de outras ações beneficentes, de modo que Eugene é considerado o benfeitor dos pobres da cidade. Devido a esse e outros motivos, Kambili admira muito o pai e por conta disso acaba não notando ou mesmo não compreendendo as dimensões das suas atitudes. 

Eugene é um religioso extremista que não aceita a existência de outras práticas que não pertençam ao catolicismo. Ele condena qualquer pessoa que não acredita no seu Deus, de modo que não permite um contato mais longo do que quinze minutos entre seus filhos e o avô por este ser pagão. O homem utiliza a religião como forma de justificar seus atos violentos e isso é algo tão constante que a opressão empregada por ele na sua família é vista como uma simples expressão do seu amor pela esposa, a qual ele agride, e seus filhos, os quais ele castiga sem pena. 

Após passar alguns dias em Nsukka, na casa da tia Ifeoma, uma professora universitária também católica, mas que aceita as crenças originais de seu povo, Kambili e o irmão mais velho, Jaja, começam a perceber que aquilo vivenciado por eles em casa não é certo. Ao conviver com a tia e os primos em uma situação totalmente diferente da sua, Kambili começa a enxergar um novo mundo, a entender melhor os seus anseios e a apresentar uma nova ideia de futuro.


O livro é narrado do ponto de vista da Kambili, uma garota que apesar da idade não possui o comportamento esperado de uma adolescente comum. Com seus quinze anos, a jovem é bastante ingênua e isso se deve à maneira como ela e o seu irmão são tratados pelos pais. Beatrice, mãe de Kambili, é completamente submissa ao marido, de modo que ele é o responsável pela "criação" dos filhos, no que diz respeito à imposição de princípios e às cobranças feitas. Por conta dessa inocência demonstrada pela protagonista no início da história, o sentimento de indignação do leitor em relação ao convívio dessa família é enorme.

A trama é ambientada na Nigéria e retrata bastante a questão da imposição de valores e costumes realizada durante o processo de colonização. Como reflexo do período colonial, o cristianismo passou a substituir as crenças típicas do lugar, de modo que boa parte da população incorporou o que havia sido determinado pelos colonizadores e começou a condenar as tradições primitivas nigerianas. Eugene representa a figura daquele que aceita os princípios "brancos" e encara as suas origens como algo errado. No entanto, a sua condição ainda contém um agravante: a religiosidade como justificativa para a opressão. 

As atitudes de Eugene são comuns no cotidiano da família e por isso a Kambili e o Jaja não encaram os seus hábitos como problemáticos. A mudança de visão dos dois jovens acontece somente a partir do momento em que eles se distanciam da sua realidade e conhecem uma forma de vida diferente, numa casa em que nem sempre tem água, em que as refeições da noite são sobras das anteriores e em que os comportamentos dos familiares são mais íntimos. Na casa da tia Ifeoma, Kambili percebe que o riso, algo tão comum entre seus primos, nunca fez parte da sua vida. 

Apesar da temática forte, Hibisco Roxo é um livro muito sensível. A maneira como a Chimamanda consegue abordar determinadas temáticas é incrível. A obra trata sobre religiosidade, regimes políticos, violência, papel da mulher, relacionamentos, ou seja, diversas questões importantes e que precisam ser discutidas, tudo isso de uma forma bastante delicada. A cada leitura eu fico mais encantada com o trabalho da Chimamanda e a minha certeza de que todos deveriam dar uma chance a essa autora só aumenta.

"Há alguns meses, ele escreveu dizendo que não queria que eu ficasse procurando os porquês, pois há certas coisas que acontecem e para as quais não podemos formular um porquê, para as quais os porquês simplesmente não existem e para as quais, talvez, eles não sejam necessários." (Pág. 317)


Minha Estante #77
Título: Hibisco Roxo
Autor (a): Chimamanda Ngozi Adichie
Páginas: 326
Editora: Companhia das Letras
Nota: 5/5
Onde comprar: Amazon | Americanas | Saraiva | Submarino 



Já leram Hibisco Roxo ou outro livro da Chimamanda? O que acharam? Me contem nos comentários!
Beijos e até o próximo post!

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9 comentários

  1. Que livro diferente! Vou confessar que pela capa eu não daria nada por ele, mas adorei o enredo se passar na nigéria e falar sobre costumes e imposições. A personagem parece ser bem forte. Gostei muito de ver a sua resenha.
    Um abraço!

    http://paragrafosetravessoes.blogspot.com.br/

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    1. A protagonista cresce bastante no decorrer da história. Fico muito feliz que tenha gostado, obrigada! Beijos ♥

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  2. Acho que muitas vezes, fica difícil enxergar uma outra realidade quando estamos imersos em uma realidade opressora. Infelizmente, ainda hoje existe muita intolerância religiosa, acho que o livro, trata-se de um caso extremo, mas nos faz refletir sobre a violência doméstica justificada através da uma religião, sem contar no preconceito com outras crenças. Não imaginava o tema do livro,mas me pareceu muito interessante! Beijos!

    Colorindo Nuvens

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    1. Com certeza, Dai. Quando iniciei a leitura, não esperava que essa temática fosse o foco da obra, mas fiquei surpresa com a maneira que a autora conseguiu abordá-la. Recomendo muito. Beijos ♥

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  3. Agrada-me esse tipo de livro, cuja história apresenta um choque de realidades vividas por uma personagem, de modo que essas experiencias distintas fazem ela ter uma visão mais ampliada e menos distorcida do mundo. Maos um para minha lista! Abraço!

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    1. Também gosto bastante de livros que retratam esse aspecto, são sempre obras bem proveitosas. Beijos ♥

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  4. Gabi!
    Nossa! Bem diferente de toda realidade religiosa vivida em nosso país e em vários lares católicos.
    Me deu a impressão que o pai é um fanático alucinado e usa a religião para encobrir seus reais instintos.
    Deve ser um ótimo livro, apesar de um enredo pesado.
    “Capacidade de saber cada vez mais sobre cada vez menos, até saber tudo sobre nada.” (Millôr Fernandes)
    cheirinhos
    Rudy
    http://rudynalva-alegriadevivereamaroquebom.blogspot.com.br/
    TOP Comentarista de NOVEMBRO com 3 livros + BRINDES e 3 ganhadores, participem!

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    1. Oi, Rudy! Acaba não sendo tão diferente assim da nossa realidade, já que a intolerância religiosa é muito presente no Brasil. O livro é maravilhoso, recomendo. Beijos ♥

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