Mayombe, de Pepetela

19:58:00


"Vocês acreditam que vamos politizar alguma coisa? Aqui só a guerra é que politiza."

Mayombe, Angola, 1960/70. Sem Medo, Comissário, Das Operações, Teoria e Lutamos são apenas alguns dos revolucionários participantes dessa guerrilha. No meio da floresta, existem dificuldades de comunicação com os integrantes do movimento que ficaram na cidade, demora de entrega dos suprimentos, chegada de pessoal despreparado, entre outras questões. Intensificando a preparação para o combate todos os dias na Base, esses homens precisam encarar não só os colonialistas, mas o impasse entre desejo de transformação social e insegurança em relação ao futuro pós independência. 

Nas décadas de 60 e 70, Angola foi marcada por lutas pela independência, movimentos contra a colonização feita por Portugal. A floresta de Mayombe foi apenas um dos cenários das guerrilhas e aos olhos de Pepetela tornou-se também personagem. Nesse livro, o autor compartilha em forma de romance e através de personagens únicos alguns pensamentos resultantes da sua própria experiência como militante do Movimento Popular de Libertação de Angola.

A obra é dividida em capítulos que retratam um curto período do cotidiano da guerrilha, abordando os comportamentos e sentimentos de diferentes personagens, de modo que não é possível determinar um protagonista, apesar de que alguns nomes recebem mais destaque. O indivíduo que possui maior representação é Sem Medo, o Comandante. Por conta da posição de grande importância no grupo, Sem Medo acaba marcando presença em vários acontecimentos, de modo que o leitor acaba se aproximando mais dele e conhecendo melhor seu ponto de vista tanto sobre questões políticas quanto existenciais, aspectos que promovem diversas reflexões ao longo da leitura.

Mayombe proporciona ao leitor a oportunidade de compreender parte da história de Angola e também de outros territórios africanos, vítimas do processo de colonização europeu. É possível perceber tanto o desejo de independência quanto os obstáculos presentes nessa luta, como por exemplo a liderança realizada por pessoas que não se importam de fato com a causa, atrapalhando na execução do movimento. Além disso, o conceito de socialismo e as implicações desse ideal na ação dos guerrilheiros é explorado. Outro ponto bastante abordado pelo autor é a rivalidade existente entre tribos distintas, fator que motiva vários conflitos no continente africano.

A escrita do Pepetela é simples e ao mesmo tempo peculiar, pois ele utiliza o português falado na Angola, empregando algumas palavras que não fazem parte do nosso vocabulário, mas que são explicadas em um glossário no final do livro e que podem ser entendidas de acordo com o contexto em que são mencionadas. O autor optou por um formato de narrativa muito interessante. Como a trama apresenta vários personagens principais, em meio aos capítulos são inseridas passagens que se assemelham a entradas de diários nas quais os indivíduos se apresentam, falando um pouco sobre si e sobre a situação que acabou de ser vivenciada. Um aspecto que pode causar um pouco de confusão no início da leitura é o uso de nomes de guerra, ou seja, novas identidades para os guerrilheiros, pois alguns deles são tipicamente africanos e um tanto difíceis de ler.

Um tópico que achei interessante no enredo foi a breve abordagem acerca da condição da mulher na sociedade angolana, que acaba se estendendo por todo o mundo. Existe apenas uma personagem feminina no livro, Ondina, e em determinadas cenas são feitos comentários sobre a questão de gênero, levantando pensamentos dos personagens que refletem a desigualdade existente. Achei importante pontuar esses momentos porque essa não é a temática principal do livro e mesmo assim o autor, que é um homem, introduziu essa discussão.

Mayombe foi uma grata surpresa. A ideia de conhecer melhor a história de Angola havia me interessado, porém eu tinha um certo receio em relação ao desenvolvimento do processo de guerrilha. Diferentemente do que eu imaginava, o livro não é repleto de ação, já que o seu real objetivo é apresentar as particularidades de várias pessoas reunidas por um propósito comum. Gostei bastante da maneira como o Pepetela construiu os personagens e ainda mais da sua escrita poética, que provoca diversas reflexões no leitor. Leitura envolvente e super recomendada.

"Queremos transformar o mundo e somos incapazes de nos transformar a nós próprios. [...] Somos uns alienados. O escravo era totalmente alienado. Nós somos piores, porque nos alienamos a nós próprios."


Minha Estante #100
Título: Mayombe
Autor (a): Pepetela
Páginas: 248
Editora: Leya Brasil
Nota: 5/5
Onde comprar: Amazon | Saraiva

Livro representante da Angola para o projeto Lendo o Mundo

Já leram Mayombe? O que acharam? Me contem nos comentários!
Beijos e até o próximo post!

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